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A decadência do discurso do homem, branco e rico e o empoderamento da mulher.

Texto de Marta Klumb 

As feiuras do mundo. Eu ansiava por escrever sobre o feio, o fétido, o barulhento, o espesso, o poder vil. Queria cuspir para o alto e ficar olhando se essa minha inquieta excrecência em sua justa trajetória cairia sobre os ombros de um qualquer homem branco e rico. Queria que caísse, mas não sabia sequer cuspir. Cuspir como macho, sabe? Essa coisa viscosa e veloz que abandona a boca em bico dos homens como ejaculação, certeira, em jato, com alvo marcado. Isso é de uma feiura poderosa. Cuspir? Ejacular? Não. Ser homem, branco e rico? Opa! Eis o nome deste ensaio.

A decadência do discurso do homem, branco e rico. Isto porque, é essa assertiva sinônimo de poder vil e cruel. É o verdadeiro triplex do poder. São os donos do discurso, os herdeiros e os reprodutores do poder opressor contra todas e todos que lhes excedemos, mulheres, pobres, negras, negros população LGBTTI. Mas, quem disse isso? Bradam eles. Isso é coisa de “mulher mal amada”. Cuidado seu moço, seu reino está se desmanchando e você pode escorregar no próprio visgo. E sabe quem disse isso? Nós, m-u-l-h-e-r-e-s! Porque a gente tem garganta para bradar, tem voz para soltar, tem voz para se visibilizar.

Tomada pela voz de Rebecca Solnit (cuja chegada na página 196, última página do livro: “Os homens explicam tudo para mim”), me fez bater com a cabeça na parede pelo sacolejo da escrita dela e tantas vozes outras de mulheres incríveis ou não, me deixei verter em cenas de vida, frases, retóricas, histórias e fatos.

Nesta tarde de domingo e sol, com minha xícara de café empunhada na mão esquerda incito os cinco dedos da mão direita a se atropelarem na pavimentação asfáltica das teclas do notebook para acompanhar o pensamento que flui, de modo quase meteórico, quando me ponho a pinçar a história das mulheres escrita por, com perdão da grosseria: “pirococéfalos” dominadores. Homens de poder. As vezes sou grosseira na escolha das palavras, ou simplesmente, as palavras vêm e eu as deixo permanecer no texto posto que assim, elas desejaram. Então, penso que não sou eu a cometer grosserias, mas a história é grosseira e por assim ser, somente pode ser vestida por palavras que lhes caibam.

Ah… por favor, leitores, espero que não estejam pensando que João é um doce de marido, José é tão carinhoso, blá, blá blá, Não é disso e é disso que falo. Trata-se de um discurso de dominação histórica que coloca muita gente como inferior, como se fossemos de segunda categoria, escravas de um sistema que somente beneficia a eles. Pergunte para o João e para o José se eles não riem ou fazem piadas de reforço ao desprezo de pessoas, se eles se sentem confortáveis ganhando mais exercendo a mesma função das mulheres, se eles admitem um mundo que naturalizou a prática do feminicídio, pergunte tão somente se eles não acham as feministas umas chatas, cheias de mimimi. Então, se não são por nós, são contra nós!

Agora, seremos nós mulheres a falarmos deles, homens? Não. Falaremos de nossas pegadas, nossos rastros em formato de palavras. Aprendemos a ser nômades, andarilhas em busca de nós mesmas. Nesses percursos fomos juntando multidões, dentro e ao nosso redor, bem aos moldes da imensidão contraditória das multidões que nos habitam, como se expressa Walt Whitman“Eu sou contraditório, eu sou imenso. Há multidões dentro de mim”. Essas multidões se alargam em mim, me inflam e me dão a sensação que muita coisa ainda há por experimentar! Quero experimentar viver em um mundo onde transitemos sozinhas na madrugada sem medo. Onde possa sentir o pertencimento acolhedor do espaço público e privado. Quero tão somente transitar onde, quando e com quem ou ninguém eu quiser.

Proponho que comecemos a pinçar, uma a uma, as palavras do dicionário que interessam ao discurso que desejamos fazer valer. Vamos transformar as palavras em ideias, as ideias em ações e as ações no mundo que precisamos para viver. Neste momento de assombroso retrocesso político, com a ascensão violenta do fascismo, consorte do machismo, no Brasil, nossa dificuldade de convencer algumas mulheres que elas têm direitos de autogestão de seus corpos torna-se ainda mais difícil, mais desafiadora. Elas têm medo d’Eles. Elas sabem do risco de morte que correm. Por isso, lutamos todas por uma! Resista! Nenhuma mulher à menos!

Neste momento histórico da luta das mulheres, está instaurado o tempo do declínio da ignorância promovida pelo discurso fake da mídia, traduzida em cenas grotescas de telenovelas, onde todo discurso nos violenta de modo bruto ou disfarçado. Abaixo a naturalização da opressão da mulher! Muito avançamos. Abrimos as portas das casas, arregaçamos as janelas e denunciamos e “colocamos a colher nas brigas de marido e mulher”, tornamos público o mundo privado dos abusadores. Ventos fortes lutam para fechar as portas e janelas novamente, mas nós resistiremos. O império entrou em decadência. Não tem mais volta. Sabem por que? Porque onde houver uma mulher, mais de cem milhões de outras mulheres se somam a ela.

Autora

Marta Klumb é feminista, psicóloga, com mestrado em psicologia na área de tanatologia, foi Conselheira suplente do CONAD por dois mandatos consecutivos representando o MEC. É consultora independente atuando na produção de materiais educativos na área de Sexualidade e Gênero, Sociedade e drogas e Desigualdade e Diversidade.

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